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Catedral da Luz

Catedral da Luz

Pé-morno

28.02.12, Bruno Vieira Amaral

Dos muitos factores que contribuem para a decisão de um campeonato o meu preferido é a estrelinha. A estrelinha, uma estrela pequenina, são os juros da sorte, é algo que se fez por merecer nos outros jogos e que recebemos num em que jogámos particularmente mal. Portanto, a estrelinha é mais ou menos racional, mais ou menos ilógica. Acontece não só quando mais se espera, mas quando mais se precisa. É como se o destino desse uma de polícia de trânsito simpático “desta vez passa, mas tenha mais cuidado da próxima.” Quando chateamos muito o destino é natural que a estrelinha se apague e que o destino nos vire as costas, não sem antes passar a multa. Num ciclo de quatro jogos decisivos, não ganhámos nenhum dos três primeiros. A estrelinha não apareceu. Fundiu-se. Jesus, que considero o melhor treinador para o Benfica, incorre frequentemente em hubris, faz pouco do destino e, vingativo, o destino não lhe dá estrelinha, deixa-o por sua conta e risco. Com um treinador mais humilde, Yannick entrava em campo e marcava. Mas como o treinador já disse que vai fazer do Yannick um grande jogador – mais hubris é impossível – o Yannick entrou em campo e foi simplesmente o Yannick e não o desejado fio condutor da corrente eléctrica da sorte. Um treinador que despreza o peso do fortuito na história será sempre incapaz de convocar a estrelinha. E há momentos em que o futebol não faz sentido nenhum (por exemplo, sempre que o Vítor Pereira faz uma substituição). Toni, esse baluarte do benfiquismo mas um treinador muito inferior ao Jesus, tinha muito daquele fechar de olhos que não é desespero, mas demonstração de respeito pelos acasos do futebol. Trapattoni, que dirigiu um plantel do Benfica muito inferior ao de Jesus, encomendava-se à virgem e mandava Mantorras aquecer: foi abençoado pela estrelinha. Jesus não é pé-frio. Se fosse, nunca teria conquistado um campeonato à primeira. Também não é pé-quente, ou não teria perdido aquela eliminatória para a Taça, nem teria visto o Porto sagrar-se campeão na Luz, um ano depois de o Benfica ter desaproveitado a oportunidade histórica de se sagrar campeão nas Antas. Jesus é um pé-morno. Ora aquece, ora arrefece. A única coisa que é certa, para além destas variações de temperatura do pé, é que quando tudo falha (as bolas paradas, porra, marquem um golinho de bola parada) nenhuma estrelinha virá em seu socorro.